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Foto do escritorLucas C. L. Falcão

Você realmente consegue avaliar a qualidade de um produto de áudio?

Atualizado: 18 de jul. de 2019

Uma parte essencial do projeto de uma caixa, seja ela uma torre, bookshelf ou monitor de estúdio, é o teste de audição. Com ele é possível ter uma avaliação subjetiva do produto e definir a aceitação da qualidade sonora do mesmo. Acredite, todos os fabricantes fazem testes de audição em seus produtos diversas vezes antes de lançá-los no mercado. No entanto, uma coisa que a maioria das pessoas não sabe é como estes testes são e devem ser realizados.


Hoje temos uma vasta gama de informações sobre como o nosso cérebro processa informações e sobre como ocorre a nossa avaliação subjetiva da qualidade sonora de um produto de áudio. Tudo isso graças ao trabalho de diversos pesquisadores como Floyd Toole, Soren Bech, John Beerends e tantos outros. Uma das coisas que sabemos, por exemplo, é que fatores como preço, tamanho, aparência e marca tem um enorme efeito na nossa percepção de qualidade, e é por isso que testes de audição nunca devem ser feitos com os produtos à mostra, devem ser preferencialmente duplo-cegos - testes realizados de forma aleatória onde o participante não consegue ver ou saber o que está escutando - de modo a evitar que sejamos influenciados pelos vieses de julgamento.


A aparência realmente importa?

Uma das provas do efeito dos vieses de julgamento foi brilhantemente provada por Floyd Toole em um teste feito nas instalações da própria Harman. Na figura 1 é possível ver duas avaliações feitas pelo mesmo grupo de avaliadores experientes. Neste grupo, todas as pessoas possuíam treinamento específico para conduzir os testes e experiência suficiente para garantir uma certa repetibilidade. Como o próprio Floyd Toole comenta, o objetivo do teste era verificar a capacidade de alguns dos avaliadores mais confiáveis da Harman em manter a sua objetividade mesmos expostos à informações visuais sobre os produtos [1].

Resultados das notas dadas por um grupo de avaliadores sobmetidos a dois testes de audição, cego e não cego, onde cada caixa representa uma cor e sua nota pode ser vista no eixo y.
Figura 1: Resultados das notas subjetivas de um grupo de avaliadores submetidos à um teste cego e, posteriormente, a um teste de audição com informações visuais das caixas [1]

O resultado seguiu o esperado: quando os avaliadores foram expostos às informações visuais, preços e marcas dos produtos a serem avaliados - cada produto é representado por uma cor -, suas notas tiveram uma discrepância muito maior do que aquelas quando os avaliadores estavam realizando testes cegos. Houve, inclusive, uma inversão na nota final entre dois produtos. Para conhecimento, os dois primeiros produtos eram torres caras de aproximadamente US$5000, grandes e visualmente impressionantes, o terceiro produto era um satélite de plástico, pequeno e barato, porém bem projetado de aproximadamente US$700, e o quarto era um produto moderadamente caro, aproximadamente US$4000, que havia recebido uma nota altíssima por reviewers respeitados. Ainda que todos os avaliadores fossem experientes o suficiente para ignorar alguns dos fatores visuais, o resultado do teste mostra que nem mesmo eles estão imunes aos vieses de julgamento.


A prática faz a perfeição

Variações na nota atribuída aos produtos são ainda mais evidentes em avaliadores que não possuem treinamento específico. A população com pouca experiência em avaliações subjetivas possui uma relativa dificuldade em identificar aspectos da qualidade sonora de um produto e em lembrar as características de outros produtos que foram testados. Para quantificar esta dificuldade, um outro experimento foi realizado com 5 grupos diferentes de pessoas. O objetivo foi avaliar a capacidade destas pessoas em manter a sua nota quando expostos a testes consecutivos, ou seja, os mesmos produtos foram avaliados diversas vezes e a repetibilidade desta avaliação foi compilada no que foi denominado como “performance dos avaliadores” [1].

No gráfico são mostradas as notas relacionadas a repetibilidade em testes de audição em caixas de som de cada um dos 5 grupos mostrados na imagem.
Figura 2: Performance de 5 grupos de pessoas quando submetidas a testes de audição [1]

O interessante nos resultados do teste é que os 4 primeiros grupos, compostos por estudantes de áreas afins ao áudio, equipes de vendas e marketing de marcas de áudio, reviewers de áudio, e vendedores de lojas que trabalham no segmento de áudio obtiveram uma nota surpreendentemente menor que o grupo de pessoas especialmente selecionadas e treinadas para esta função. Uma outra surpresa foi a posição dos reviewers de áudio, cujas opiniões são fortemente consideradas na decisão de compra dos consumidores médios, mas que obtiveram uma nota relativamente baixa em comparação com o seu poder de influência.


É surpreendente como a avaliação feita por apenas 12 pessoas treinadas tem uma confiabilidade muito maior que a avaliação feita por outras 256 pessoas não treinadas. Isso só nos mostra como é importante selecionar bem as pessoas a quem vamos confiar o julgamento da qualidade sonora de um certo produto e se certificar que estas mesmas pessoas possuem um treinamento adequado para performar estes testes.


De um modo geral, a conclusão que podemos chegar em relação a estas duas pesquisas é que somos fortemente influenciados por vieses de julgamento e, em alguns casos, por uma inabilidade em identificar características de um produto de áudio. Para concluir, trago uma frase do próprio Floyd Toole em uma palestra dada no CIRMMT em Abril de 2015: “Não confio em nenhum teste de audição ou avaliação em que os participantes tenham sido capazes de ver os produtos”.


Espero que tenhamos conseguido passar um pouco mais sobre acústica para vocês e que continuem lendo nossos posts.


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Referências:

[1] TOOLE, Floyd E. Audio–Science in the Service of Art. Harman International, v. 2004, 1999.

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